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sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

CRÔNICA A RIQUEZA DA BRUZUNDANGA - LIMA BARRETO - ATIVIDADES PARA O ENSINO MÉDIO



Os bruzundangas, de Lima Barreto, é uma coletânea das crônicas originalmente publicadas no jornal A.B.C., durante o ano de 1917. A coletânea só foi lançada em livro em 1923, quando o escritor já havia morrido.

Sob o nome Bruzundanga, país ficcional, pode-se identificar facilmente o Brasil, que na época passava por mudanças políticas aparentemente radicais, mas que em nada melhoraram a condição de vida das classes menos privilegiadas.

Nessa obra, Lima Barreto trata da política, do ensino, da religião, das artes e de vários outros aspectos da Bruzundanga.

Leia, a seguir, parte de uma dessas crônicas.

A RIQUEZA DA BRUZUNDANGA
Lima Barreto

Quando abrimos qualquer compêndio de geografia da Bruzundanga, quando se lê qualquer poema patriótico desse país, ficamos com a convicção de que essa nação é a mais rica da terra.

A Bruzundanga, diz um livro do grande sábio Volkate Ben Volkate, possui nas entranhas do seu solo todos os minerais da terra.

A província das jazidas tem ouro, diamantes; a dos Bois, carvão de pedra e turfa; a dos Cocos, diamantes, ouro, mármore, safiras, esmeraldas; a dos Bambus, cobre, estanho e ferro. No reino mineral, nada pede o nosso país aos outros. Assim também no vegetal, em que é sobremodo rica a nossa maravilhosa terra.

A borracha, continua ele, pode ser extraída de várias árvores que crescem na nossa opulenta nação; o algodoeiro é quase nativo; o cacau pode ser colhido duas vezes por ano; a cana-de-açúcar nasce espontaneamente; o café, que é a sua principal riqueza,dá quase sem cuidado algum e assim todas as plantas úteis nascem na nossa Bruzundanga com facilidade e rapidez, proporcionando ao estrangeiro a sensação de que ela é o verdadeiro paraíso terrestre.

Nesse tom, todos os escritores, tanto os mais calmos e independentes como os de encomenda, cantam a formosa terra da Bruzundanga.

Os seus acidentes naturais, as suas montanhas, os seus rios, os seus portos são também assim decantados. Os seus rios são os mais longos e profundos, do mundo; os seus portos, os mais fáceis ao acesso de grandes navios e os mais abrigados etc, etc.

Entretanto, quem examinar com calma esse ditirambo e o confrontar com a realidade dos fatos há de achar estranho tanto entusiasmo.

A Bruzundanga tem carvão, mas não queima o seu nas fornalhas de suas locomotivas. Compra-o à Inglaterra, que o vende por bom preço. Quando se pergunta aos sábios dos país por que isto se dá, eles fazem um relatório deste tamanho e nada dizem. Falam em calorias, em teor de enxofre, em escórias, em grelhas, em fornalhas, em carvão americano, em briquettes, em camadas, e nada explicam de todo. Os do povo, porém, concluem logo que o tal carvão de pedra da Bruzundanga não serve para fornalhas, mas, com certeza, pode ser aproveitado como material de construção, por ser de pedra.

O que se dá com o carvão, dá-se com outras riquezas da Bruzundanga. Elas existem, mas ninguém as conhece. O ouro, por exemplo, é tido como uma das fortunas da Bruzundanga, mas lá não corre uma moeda desse metal. Mesmo, nas montras dos cambistas, as que vemos são estrangeiras. Podem ser turcas, abexins, chinas, gregas, mas do país não há nenhuma. Contudo, todos afirmam que o país é a pátria do ouro.

O povo da Bruzundanga é doce e crente, mais supersticioso do que crente, e entre as suas supertições está esta do ouro. Ele nunca o viu, ele nunca sentiu o seu brilho fascinador; mas todo bruzundanguense está certo de que possui no seu quintal um filão de ouro.

Com o café dá-se uma cousa interessante. O café é tido como uma das maiores riquezas do país; entretanto é uma das maiores pobrezas. Sabem por quê? Porque o café é o maior "mordedor" das finanças da Bruzundanga.

Eu me explico. O café, ou antes, a cutura do café é a base da oligarquia política que domina a nação. A sua árvore é cultivada em grandes latifúndios pertencentes a essa gente que, em geral, mal os conhece, deixando-os entregues a administradores, senhores, nessas vastas terras, de braço e cutelo, distribuindo soberanamente jsutiça, só não cunhando moeda, porque, desde séculos, tal cousa é privilégio do Rei.

Os proprietários dos latifúndios vivem nas cidades, gastando à larga, levando vida de nababos e com funaças de aristocratas. Quando o café não lhes dá o bastante para as suas imponências e as da família, começam a clamar que o país vai à garra; que é preciso salvar a lavoura; que o café é a base da vida econômica do país; e - zás - arranjam meios e modos do governo central decretar um empréstimo de milhões para valorizar o produto.

Curiosos economistas que pretendem elevar o valor de uma mercadoria cuja oferta excede às necessidades da procura. Mais sábios, parece, são os donos de armarinhos que dizem vender barato para vender muito...

Arranjado o empréstimo, está a coisa acabada. Eles, os oligarcas, nadam em ouro durante cinco anos, todo o país paga os juros e o povo fica mais escorchado de impostos e vexações fiscais. Passam-se os anos, o café não dá o bastante para o luxo dos doges, dogaresas e dogarinhas da baga rubra, e logo eles tratam de arranjar um anova valorização.

A manobra da "valorização" consiste em fazer que o governo compre o café por um preço que seja vantajoso aos interessados e o retenha em depósito; mas, acontece que os interessados são, em geral, governo ou parentes dele, de modo que os interessados fixam para eles mesmos o preço da venda, preço que lhes dê fartos lucros, sem se incomodar que "o café" venha a ser, senão a pobreza, ao menos a fonte da pobreza da Bruzundanga, com os tais empréstimos para as valorizações.

Além disso, o café esgota as terras, torna-as maninhas, de modo que regiões do país, que foram opulentas pela sua cultura, em menos de meio século ficaram estéreis e sáfaras.

BARRETO, Lima. A riqueza da Bruzundanga. In: Os bruzundangas. São Paulo: Ática, 1985.


ATIVIDADES

1. Qual a principal crítica social presente na crônica "A riqueza da Bruzundanga"?

a) A exploração dos recursos naturais do país pelas grandes potências estrangeiras.
b) A corrupção política e a concentração de riqueza nas mãos de poucos.
c) A falta de investimento em educação e desenvolvimento tecnológico.
d) A dependência econômica do Brasil em relação à produção de café.

2. Qual a função do país fictício Bruzundanga na obra de Lima Barreto?

a) Satirizar os costumes e as mazelas da sociedade brasileira da época.
b) Criar um universo fantástico e desvinculado da realidade brasileira.
c) Idealizar um país com grandes potencialidades e recursos naturais.
d) Celebrar a cultura e a história do Brasil.

3. Qual é a principal crítica de Lima Barreto ao sistema de "valorização do café"?

a) A falta de investimento em outras culturas agrícolas.
b) A exploração dos trabalhadores rurais.
c) A corrupção e o enriquecimento ilícito dos políticos.
d) A dependência do Brasil em relação ao mercado internacional.








GABARITO
1: B
2: A
3: C


 







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