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sexta-feira, 27 de novembro de 2020

ATIVIDADES - LEITURA E INTERPRETAÇÃO DE TEXTOS - ENSINO MÉDIO COM GABARITO


QUESTÕES DE LÍNGUA PORTUGUESA

CONTEÚDOS: Interpretação de texto


QUESTÃO 1

Leia abaixo o trecho de Deus Foi Almoçar, romance de Ferréz, publicado em 2011.


“Datas, dias, minutos e segundos, atrasos, interesses, ganhos e perdas, a vida era assim agora. Ele sorriu levemente, o homem é o único ser capaz de fazer uma armadilha para si mesmo.

Carros, apartamentos, pequenos bares, shoppings, tudo congestionado, tudo limitado, emparedado, fechado. A sensação de sair dessas coisas era indescritível, se tivesse uma pena por assalto ou homicídio, tanto fazia. Prisão ou shopping center? Não precisava olhar tudo para saber o que existia realmente, mas por mais que olhasse não saberia dizer o que era verdade”.


[FERRÉZ. Deus foi almoçar. São Paulo: Planeta, 2012]


No trecho acima, podemos observar: 


(A) a infelicidade do narrador com sua própria vida.

(B) a perturbação emocional do personagem que não sabe o que é falso ou o que é real.

(C) a constatação de suas próprias limitações projetadas no espaço externo.

(D) uma crítica à forma como vivemos nas cidades a partir da sensação de aprisionamento.

(E) a incapacidade de ser feliz em espaços urbanos.

 

QUESTÃO 2

 

14 coisas que você não deve jogar na privada


Nem no ralo. Elas poluem rios, lagos e mares, o que contamina o ambiente e os animais. Também deixa mais difícil obter a água que nós mesmos usaremos. Alguns produtos podem causar entupimentos:


- cotonete e fio dental

- medicamento e preservativo;

- óleo de cozinha;

- ponta de cigarro;

- poeira de varrição de casa;

- fio de cabelo e pelo de animais;

- tinta que não seja à base de água;

- querosene, gasolina, solvente, tíner.


Jogue esses produtos no lixo comum. Alguns deles, como óleo de cozinha, medicamento e tinta, podem ser levados a pontos de coleta especiais, que darão a destinação final adequada.


MORGADO, M.; EMASA. Manual de etiqueta. Planeta Sustentável, jul.-ago. 2013 (adaptado).


O texto tem objetivo educativo. Nesse sentido, além do foco no interlocutor, que caracteriza a função conativa da linguagem, predomina também nele a função referencial, que busca


(A) despertar no leitor sentimentos de amor pela natureza, induzindo-o a ter atitudes responsáveis que beneficiarão a sustentabilidade do planeta.

(B) informar o leitor sobre as consequências da destinação inadequada do lixo, orientando-o sobre como fazer o correto descarte de alguns dejetos.

(C) transmitir uma mensagem de caráter subjetivo, mostrando exemplos de atitudes sustentáveis do autor do texto em relação ao planeta.

Descartar alternativa

(D) estabelecer uma comunicação com o leitor, procurando certificar-se de que a mensagem sobre ações de sustentabilidade está sendo compreendida.

(E) explorar o uso da linguagem, conceituando detalhadamente os termos utilizados de forma a proporcionar melhor compreensão do texto.

 

QUESTÃO 3

 

Ainda estou surpresa com a magnitude dessa história. Eu sou uma garota de romances, de histórias previsivelmente encantadoras e perfeitas, do tipo que terminam de uma maneira bela, feliz e eterna. Entretanto, mesmo receosa, fui conquistada pela narrativa inovadora da autora Gillian Flynn, que optou por mostrar uma faceta obscura e psicótica dos casamentos, indo muito além do “viveram felizes para sempre”. A trama é intensa, confusa, surpreendente e dolorosamente real.


Aqui as aparências enganam, a lógica é trapaceada pela imaginação, e os personagens são de carne e osso: rancorosos, vingativos, mentirosos… nunca imaginei que diria isso, mas Garota Exemplar é um dos melhores e mais verdadeiros livros que já li. E isso não significa que a história seja um reflexo puro de nossa sociedade, mas sim que a trama é capaz de mostrar com veracidade a obscuridade da mente humana – o que, sem dúvida, dá margem para infinitas reflexões sobre quem nós verdadeiramente somos sem máscaras e sem falsidades.


O livro é narrado sob duas perspectivas (intercaladas entre presente e passado): a de Nick, que descobre que sua mulher desapareceu e segue os dias a procura dela; e a do diário de Amy, que retrata o casamento dos dois, mostrando as falhas de Nick como marido e dando vida ao medo que ela estava sentindo de seu esposo.

De começo, a leitura é meio arrastada entre as reflexões emocionais de Nick, entretanto em menos de cinquenta páginas o clima do livro esquenta e as dúvidas começam a afligir o leitor. O fato é que os pontos de vista dos protagonistas são completamente discrepantes, de forma que enquanto Nick descreve uma esposa fria e um casamento desmoronando, Amy escreve sobre amor, recomeços, e um Nick alheio às tentativas de reconciliação de sua esposa.

Portanto, a grande dúvida da trama não é apenas a respeito do que realmente aconteceu com Amy, mas sim de quem, nesse emaranhado de emoções e lembranças, está dizendo a verdade: Nick, com sua frieza e indiferença calculada, ou Amy, com seu sorriso dócil e memórias calorosas? E o charme da história é que, independente de nossas teorias, a autora consegue surpreender completamente o leitor, deixando-nos de queixo caído com seu talento e criatividade. [...]

ALEKSANDRA, Paola. Livros e fuxicos. Disponível em:http://www.livrosefuxicos.com/2014/10/resenha-garota-exemplar-gillian-flynn.html. Acesso em: 29 jun. 2020


Na construção de um texto, o autor realiza escolhas para cumprir determinados objetivos. Nesse sentido, o texto acima apresenta a função social de


(A) interpretar a obra a partir dos acontecimentos da narrativa.

(B) fazer a apreciação de uma obra a partir de uma síntese crítica.

(C) apresentar o resumo do conteúdo da obra de modo impessoal.

(D) classificar a obra como uma referência para estudiosos da psicologia.

(E) informar o leitor sobre a veracidade dos fatos descritos na obra.


QUESTÃO 4


Analise o quadro e leia o texto para responder à questão:


Brasil: população segundo Grupos de Idades (em %) em Relação à população Total

Ano

1940

1970

1995

2000

2010

Igual ou superior a 60 anos

4,10%

5,20%

7,00%

38,60%

13,60%

De 20 a 59 anos

42,60%

41,80%

50,60%

53,50%

58,00%

De 0 a 19 anos

53,30%

53,00%

42,40%

7,90%

28,40%


(Fonte do autor elaborado com base nos dados do IBGE).


Sábado, 6 da manhã. A algazarra domina a estação central de trem de Campinas, a 100 quilômetros de São Paulo. Cinquenta turistas de cabelos grisalhos preparam-se para embarcar rumo a um passeio pelo interior paulista. A bordo de uma “Maria-fumaça”, a euforia é tanta que aqueles senhores e senhoras até parecem colegiais em viagem de férias. No caminho, pausa para visitar um museu de locomotivas antigas e quatro seculares fazendas de café. Duas horas depois o grupo desembarca na cidade de Itu. Lá eles passam o resto do dia no Camping Casarão. Aprendem a montar e desmontar uma barraca e fazem caminhada pelo meio da mata. Acampamento para idosos? Até pouco tempo atrás, seria mesmo de estranhar.


(Revista Veja).


Faça a associação entre o quadro e o texto e assinale a alternativa correta.


(A) O crescimento do número de idosos, no país, em função do aumento das taxas de natalidade favoreceu a atividade turística.

(B) O crescimento do número de idosos, nas últimas décadas, em função da maior longevidade criou uma importante demanda de lazer para a terceira idade.

(C) A predominância de adultos na estrutura etária brasileira em função da maior longevidade favoreceu o processo de informalidade na atividade turística.

(D) O conhecimento da estrutura etária de um país é muito importante para organizar o fluxo turístico em todas as faixas etárias.

(E) O conhecimento da estrutura etária brasileira permite avaliar o potencial turístico entre os idosos, adultos e jovens.

 

QUESTÃO 5

 

PARÁFRASE


A paráfrase é a possibilidade de traduzir as palavras de um texto por outras de sentido equivalente, mantendo, porém, as ideias originais. A paráfrase inclui o desenvolvimento de um texto, o comentário, a explicação. A substituição de uma palavra por outra é a paráfrase que mais se aproxima do original. O desenvolvimento, o comentário, a explicação, o resumo são textos parafrásicos, se comparados com o original. (MEDEIROS, 2009)


Em relação às ideias expostas acima, leia as possíveis alternativas que justificam “a importância da paráfrase na composição textual de um trabalho científico”.


I – O primeiro dado é de que os textos originais contêm informações complexas, que podem apresentar dificuldades de entendimento.

II – Informações de primeiro grau são informações complexas a que poucos têm acesso; para que cheguem a um número maior de pessoas, é preciso diluí-las.

III – A tradução acarreta a diluição do conhecimento, acarretando em uma informação nova, mas de mesmo valor.


Está correto o que se afirma apenas em


(A) I.

(B) I e II.

(C) I e III.

(D) II e III.

(E) I, II e III.


QUESTÃO 6

Leia o texto a seguir:


A avó de minha amiga está com 90 anos feitos. Vive muito modestamente, mas tem o costume de lembrar as visitas:

- Pois é. Eu fui casada com um ministro...

Um velho empregado, cria de família, de tanto ouvir aquilo acabou dizendo com o desembaraço dos velhos servidores:

- A senhora não deve ficar repetindo essa coisa. Quando a gente bate numa porta a pessoa lá dentro sempre pergunta:

“Quem é?” Ninguém pergunta: “Quem foi?”


Rubem Braga.


Os ditados populares, em sua concisão, trazem consigo a significação de uma experiência, traduzida com lapidar sabedoria. No caso dessa crônica, a experiência é a que se depura da


(A) fala da avó às visitas, e um ditado adequado seria: Nem tudo o que reluz é ouro.

(B) fala da avó às visitas, e um ditado adequado seria: Depois da tempestade vem a bonança.

(C) reação silenciosa das visitas, e um ditado adequado seria: Quem vê cara não vê coração.

(D) intervenção do velho empregado, e um ditado adequado seria: Águas passadas não movem moinho.

(E) intervenção do velho empregado, e um ditado adequado seria: De onde menos se espera, daí é que vem.


QUESTÃO 7


Retrato de uma princesa desconhecida


Para que ela tivesse um pescoço tão fino

Para que os seus pulsos tivessem um quebrar de caule

Para que os seus olhos fossem tão frontais e limpos

Para que a sua espinha fosse tão direita

E ela usasse a cabeça tão erguida

Com uma tão simples claridade sobre a testa

Foram necessárias sucessivas gerações de escravos

De corpo dobrado e grossas mãos pacientes

Servindo sucessivas gerações de príncipes

Ainda um pouco toscos e grosseiros

Ávidos cruéis e fraudulentos

Foi um imenso desperdiçar de gente

Para que ela fosse aquela perfeição

Solitária exilada sem destino


(ANDRESEN, S. M. B. Dual. Lisboa: Caminho, 2004. p. 73.)


No poema, a autora sugere que


(A) os príncipes e as princesas são naturalmente belos.

(B) o exílio e a solidão são os responsáveis pela manutenção do corpo esbelto da princesa.

(C) a beleza da princesa é desperdiçada pela miscigenação racial.

(D) os príncipes generosos cultivavam a beleza da princesa.

(E) o trabalho compulsório de escravos proporcionou privilégios aos príncipes.


QUESTÃO 8


Leia as charges a seguir:

 

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 Reunindo-se as informações contidas nas duas charges, infere-se que

 

(A) os regimes climáticos da Terra são desprovidos de padrões que os caracterizam.

(B) as intervenções humanas nas regiões polares são mais intensas que em outras partes do globo.

(C) o processo de aquecimento global será detido totalmente com a eliminação das queimadas.

(D) a destruição das florestas tropicais é uma das causas do aumento da temperatura em locais distantes como os polos.

(E) os parâmetros climáticos modificados pelo homem afetam todo o planeta, mas os processos naturais (leis científicas) têm alcance apenas regional.


QUESTÃO 9

 

Fascínio, modelos e linguagem da TV


Todas as noites, às oito horas, a casa da vovó ficava cheia. Uns chegavam em cima da hora, outros já estavam lá esperando desde cedo. Conversavam sobre muitos assuntos, mas o motivo mesmo de tão frequente visita era a televisão. Vovó era a única da rua que possuía televisão. Eu me lembro que, nos domingos à tarde, toda a molecada da rua vinha à casa da vovó assistir à televisão. Ficavam empoleirados na escada, e não havia espetáculo mais atraente do que aquele cineminha de graça.

Talvez por já estar acostumado, eu conseguisse entender o porquê de tamanha curiosidade quanto aos desenhos animados: o aparelho era uma grande novidade.


À noite, mudava o público. Antes, a casa da vovó não ficava tão cheia, com tanta frequência. Com a chegada do aparelho, as pessoas vinham, cumprimentavam-se, sentavam-se e logo começavam a ver a televisão. Eram os “televizinhos”, como se dizia na época.


Hoje isso já não existe porque todo o mundo tem televisão. O aparelho tornou-se presença obrigatória nos lares.


A televisão daquela época era mágica. Embora transmitisse em preto e branco programas feitos sem profissionalismo, com imagens tecnicamente ruins, ela possuía um fascínio único. As pessoas falavam com os apresentadores, achando que estavam sendo vistas, paravam de conversar a cada momento, ficavam magnetizadas pelo novo aparelho e só voltavam ao normal quando o desligavam. Mas sua sedução permanecia. Desligar o aparelho parecia um retorno ao ambiente de casa, ao cotidiano, à mesmice das histórias de rua, dos parentes, dos amigos. Ligá-lo, ao contrário, abria um espaço para se entrar em outros mundos.


Muito se falou – e ainda se fala – que a televisão veio suprir o diálogo doméstico, a conversa das pessoas. Pode ser. Em alguns casos. Em outros, ela veio introduzir diálogos e discussões.


Por ser um meio totalizante, ela inova, apresentando exemplos de vida, de ambientes, de situações que acabam funcionando como modelos. Se as conversas domiciliares giravam em torno do conhecido (a rua, a família, os parentes) ou da vida pública (a política, a religião, o futebol), a televisão traz agora “novos momentos”, novas realidades, que mostram mundos desconhecidos e inovadores para o público. Nesse sentido, ela amplia os antigos horizontes de discussão e o diálogo das pessoas, dilatando sua vivência com esses novos dados. [...]


O autor do texto


(A) critica a influência da TV nas relações familiares e no desenvolvimento intelectual dos jovens e adultos.

(B) afirma que a linguagem inovadora da TV altera os hábitos sociais e culturais, causando assim uma regressão cultural da sociedade.

(C) defende a ideia de que a linguagem da TV é sedutora e que não acabou com o diálogo familiar, mas contribuiu para modificá-lo.

(D) concorda que as crianças ficam mais dispersas e com perda de concentração ao ficarem diversas horas diante da TV.

(E) defende a ideia de que muitos dos novos programas de TV, diferentemente dos mais antigos, servem para alienar os telespectadores.


QUESTÃO 10

 

Cidade grande

 

Que beleza, Montes Claros.

Como cresceu Montes Claros.

Quanta indústria em Montes Claros.

Montes Claros cresceu tanto,

ficou urbe tão notória,

prima-rica do Rio de Janeiro,

que já tem cinco favelas

por enquanto, e mais promete.

 

(Carlos Drummond de Andrade)

 

Entre os recursos expressivos empregados no texto, destaca-se a

 

(A) metalinguagem, que consiste em fazer a linguagem referir-se à própria linguagem.

(B) intertextualidade, na qual o texto retoma e reelabora outros textos.

(C) ironia, que consiste em se dizer o contrário do que se pensa, com intenção crítica.

(D) denotação, caracterizada pelo uso das palavras em seu sentido próprio e objetivo.

(E) prosopopeia, que consiste em personificar coisas inanimadas, atribuindo-lhes vida.



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GABARITO


1 - D 

2 - B

3 - B

4 - B

5 - E

6 - D

7 - E

8 - D

9 - C

10 - C






segunda-feira, 20 de julho de 2020

PRÉ-MODERNISMO - OS BRUZUNDANGAS - ATIVIDADES COM GABARITO

PRÉ-MODERNISMO: OS BRUZUNDANGAS 


O texto a seguir foi extraído do livro “Os bruzundangas”, cujo nome quer dizer “confusão, trapalhada”. É um relato sobre uma república que facilmente pode ser identificada com o Brasil da época de Lima Barreto, seu autor. O capítulo “Os samoiedas”, que apresentamos a seguir, trata da literatura “daquele” país, constituindo uma crítica irônica aos escritores brasileiros dos primeiros anos da república



O que caracteriza a literatura daquele país é uma curiosa escola literária lá conhecida por – “Escola Samoieda”. [...] 


Para mais perfeito ensinamento dos leitores vou-lhes repetir um trecho de conversa que ouvi entre três dos tais poetas da Bruzundanga, adeptos extremados da Escola Samoieda. 


Quando cheguei, eles já estavam sentados em torno da mesa do café. Acabava eu de assistir uma aula de geologia na Faculdade de Ciências do país; o meu espírito vinha cheio de silhuetas de monstros de outras épocas geológicas. Eram ictiossauros, megatérios, mamutes; era do sinistro pterodáctilo que eu me lembrava; e não sei por que, quando deparei os três poetas samoiedas, me deu vontade de entrar no botequim e tomar parte na conversa deles. 


A Bruzundanga, como sabem, fica nas zonas tropical e subtropical, mas a estética da escola pedia que eles se vestissem com peles de urso, de renas, de martas e raposas árticas. 


É um vestuário barato para os samoiedas autênticos, mas caríssimo para os seus parentes literários dos trópicos. 


Estes, porém, crentes na eficácia da vestimenta para a criação artística, morrem de fome, mas vestem-se à moda da Sibéria. 


Estavam assim vestidos, naquela tarde, quente, ali naquele café da capital da Bruzundanga, três dos seus novos e soberbos vates; estavam ali: Kotelniji, Wolpuk e Korspikt, o primeiro que tinha aplicado o vernier para "medir" versos. 


Abanquei-me e pude perceber que acabavam de ouvir uma poesia do poeta Worspikt. Tratava de lua, de iceberg, - descobri eu por uma e outra consideração que fizeram. 


Nenhum deles tinha visto um iceberg, mas gabavam os ouvintes a moção com que o outro traduzira em verso o espetáculo desse fenômeno das circunvizinhanças dos pólos. 


Num dado momento Kotelniji disse para Worspikt: 


- Gostei muito desse teu verso: - "há luna loura linda leve, luna bela!" 


O autor cumprimentado retrucou: 


- Não fiz mais do que imitar Tuque-Tuque, quando encontrou aquela soberba harmonia imitativa para dar idéia do luar - "Loga Kule Kulela logalam", no seu poema "Kulelau". 


Wolpuk, porém, objetou: 


- Julgo a tua excelente, mas teria escolhido a vogal forte "u", para basear a minha sugestão imitativa do luar. 


- Como? perguntou Worspikt. 


Eu teria dito: Ui! "lua uma pula, tu moo! sulla nuit!” 


- Há muitas línguas nela, objetou Kotelniji. 


- Quantas mais melhor, para dar um caráter universal à poesia que deve sempre tê-lo, como ensina o mestre, defendeu-se Wolpuk. 


- Eu, porém, aduziu Kotelniji, conquanto permita nos outros certas licenças poéticas, tenho por princípio obedecer às mais duras e rígidas regras, não me afastar delas, encarcerar bem o meu pensamento. No meu caso, eu empregaria a vogal "a" para a harmonia em vista. 


- Mas Tuque-Tuque... fez Worspikt. 


- Ele empregou o "e" no tal verso que você citou, devido à pronunciação que essa letra lá tem. É um "e" molhado que evoca bem o luar deles, mas... 


- E com "a", como é? Indagou Wolpuk. 


- O "a" é o espanto; seria aí o espanto do homem dos trópicos, diante da estranheza do fenômeno ártico que ele não conhece e o assombra. 


- Mas Kotelniji, eu visava o luar. 


- Que tem isso? Na harmonia em "a" também entra esse fenômeno que é o provocador do teu espanto, causado pela sua singularidade local, e pela hirta presença do iceberg, branco, fantástico, que, a lua ilumina. 


- Bem, perguntou o autor da poesia; como você faria, Kotelniji? 


- Eu diria: "A lua acaba de calar a caraça parva". 


- Mas não teria nada que ver com o tema da poesia, objetou Wolpuk. 


- Como? O iceberg toma as formas mais variadas... Demais, há sempre onde encaixar, seja qual for a poesia, uma feliz "imitativa". 


- Você tem razão, aplaudiu Wolpuk. 


Worspikt concordou também e prometeu aproveitar a maravilhosa trouvailhe do amigo de letras. 


 

LIMA BARRETO. Os samoiedas. In: ______. Os bruzundangas. São Paulo: Ática, 1985. p. 26-28



Vocabulário 

Caraça: máscara, carranca; cara larga e cheia 

Parva: tola 

Samoieda: habitante do extremo norte da Rússia 

Vernier (fr): instrumento para uso em cálculos matemáticos. 



RESPONDA COM BASE NO TEXTO


1. Além do estilo literário, o que mais imitavam os poetas da Bruzundanga? 


2. Destaque do texto duas razões suficientes para que os poetas da Bruzundanga não imitassem a maneira de vestir dos samoiedas autênticos. 


3. Em que passagem do texto o narrador ironiza, através de uma referência a Worspikt, a preocupação dos parnasianos e simbolistas com a perfeição métrica? 


4. Que elemento do verso de Worspikt revela total alheamento em relação à natureza de Bruzundanga? 


5. Através de que afirmação de Worspikt o narrador ironiza os autores brasileiros que imitavam os parnasianos e simbolistas europeus? 


6. A referência irônica aos poetas simbolistas é feita através da obsessão dos samoiedas por um recurso estilístico. Que recurso é esse? 


7. Na época de Lima Barreto, os poetas, em sua maioria, estavam mais preocupados com a maneira de dizer do que com o que havia de ser dito. No texto, esse fato acaba por fazer com que um dos poetas samoiedas diga um verso ridículo, que nada tem que ver com o tema da poesia. Que verso é esse? 


8. Que justificativa é dada por Kotelniji diante da objeção de Wolpuk a seu verso? 


9. Comente a relação entre os poetas da “Escola Samoieda” e os poetas brasileiros parnasianos e simbolistas. 





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GABARITO


1. Eles imitavam alguns costumes, como por exemplo, frequentar botequim e cafés. 

2. A Bruzundanga fica nas zonas tropical e subtropical (locais quentes), mas os poetas samoiedas vestem roupas feitas com pele de urso, de renas, de martas e raposas árticas (roupas especialmente úteis para regiões de clima frio). Outra, é um vestuário caríssimo para os literários dos trópicos e barato para os samoiedas autênticos. 

3. Worspikt foi o primeiro poeta que tinha aplicado o vernier para “medir” versos. 

4. A palavra iceberg usada no verso uma vez que os poetas nunca haviam visto um iceberg. 

5. Quando ele afirma: “Não fiz mais do que imitar Tuque-Tuque, quando encontrou aquela soberba harmonia imitativa para dar ideia do luar.” 

6. As figuras de linguagem assonância (repetição de vogais) e a aliteração (repetição de consoantes). 

7. Loga kule kulela logalam.  

8. Permita nos outros certas licenças poéticas, tenho por princípio obedecer às mais duras e rígidas regras, não me afastar delas, encarcerar bem o meu pensamento. 

9. Os poetas da Escola Samoieda são como os poetas brasileiros das escolas parnasiana e simbolista: em seus versos não falam sobre a realidade em que vivem, acovardam-se dos problemas sociais do país, preferem palavras eruditas e modismos de outras nações.