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sábado, 15 de janeiro de 2022

LEITURA - FRAGMENTO DA OBRA VIDAS SECAS DE GRACILIANO RAMOS

 




VIDAS SECAS de GRACILIANO RAMOS (fragmento)


Fabiano ia satisfeito. Sim senhor, arrumara-se. Chegara naquele estado, com a família morrendo de fome, comendo raízes. Caíra no fim do pátio, debaixo de um juazeiro, depois tomara conta da casa deserta. Ele, a mulher e os filhos tinham-se habituado à camarinha escura, pareciam ratos - e a lembrança dos sofrimentos passados esmorecera.

Pisou com firmeza no chão gretado, puxou a faca de ponta, esgaravatou as unhas sujas. Tirou do aió um pedaço de fumo, picou-o, fez um cigarro com palha de milho, acendeu-o ao binga, pôs-se a fumar regalado.

- Fabiano, você é um homem, exclamou em voz alta.

Conteve-se, notou que os meninos estavam perto, com certeza iam admirar-se ouvindo-o falar só. E, pensando bem, ele não era homem: era apenas um cabra ocupado em guardar coisas dos outros. Vermelho, queimado, tinha os olhos azuis, a barba e os cabelos ruivos: mas como vivia em terra alheia, cuidava de animais alheios, descobria-se, encolhia-se na presença dos brancos e julgava-se cabra.

Olhou em torno, com receio de que, fora os meninos, alguém tivesse percebido a frase imprudente. Corrigiu-a, murmurando:

- Você é um bicho, Fabiano.

Isto para ele era motivo de orgulho. Sim senhor, um bicho, capaz de vencer dificuldades.

Chegara naquela situação medonha - e ali estava, forte, até gordo, fumando o seu cigarro de palha.

Era. Apossara-se da casa porque não tinha onde cair morto, passara uns dias mastigando raiz de imbu e semente de mucunã. Viera a trovoada. E, com ela, o fazendeiro, que o expulsara. Fabiano fizera-se desentendido e oferecera os seus préstimos, resmungando, coçando os cotovelos, sorrindo aflito. O jeito que tinha era ficar. E o patrão aceitara-o, entregara-lhe as marcas de ferro.

Agora Fabiano era vaqueiro, e ninguém o tiraria dali. Aparecera como um bicho, entocara-se como um bicho, mas criara raízes, estava plantado. Olhou as quipás, os mandacarus e os xique-xiques. Era mais forte que tudo isso, era como as catingueiras e as baraúnas. Ele, Sinhá Vitória, os dois filhos e a cachorra Baleia estavam agarrados à terra.

Chape-chape. As alpercatas batiam no chão rachado. O corpo do vaqueiro derreava-se, as pernas faziam dois arcos, os braços moviam-se desengonçados. Parecia um macaco.

Entristeceu. Considerar-se plantado em terra alheia! Engano. A sina dele era correr mundo, andar para cima e para baixo, à toa, como judeu errante. Um vagabundo empurrado pela seca. Achava-se ali de passagem, era hóspede. Sim senhor, hóspede que demorava demais, tomava amizade à casa, ao curral, ao chiqueiro das cabras, ao juazeiro que os tinha abrigado uma noite.


RAMOS, Graciliano. Vidas secas. 27. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1970, p. 53-55.






sábado, 1 de janeiro de 2022

QUESTÕES DE LÍNGUA PORTUGUESA - MODELO ENEM - ENSINO MÉDIO


QUESTÃO 01: (ENEM 2007) Leia o texto a seguir.

Há cerca de dez anos, estimava-se que 11,2% da população brasileira poderiam ser considerados dependentes de álcool. Esse índice, dividido por gênero, apontava que 17,1% da população masculina e 5,7% da população feminina eram consumidores da bebida. Quando analisada a distribuição etária desse consumo, outro choque: a pesquisa evidenciou que 41,2% de estudanes da educação básica da rede pública brasileira já haviam feito uso de álcool.
Dados atuais apontam que a porcentagem de dependentes de álcool subiu para 15%. Estima-se que o país gaste 7,3% do PIB por ano para tratar de problemas relacionados ao alcoolismo, desde o tratamento de pacientes até a perda da produtividade no trabalho. A indústria do álcool no Brasil, que produz do açúcar ao álcool combustível, movimenta 3,5% do PIB.

Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 28, n. 4, dez. 2006.

A partir dos dados acima, conclui-se que

(A) o país, para tratar pessoas com problemas provocados pelo alcoolismo, gasta o dobro do que movimenta para produzir bebida alcoólica.
(B) o aumento do número de brasileiros dependentes de álcool acarreta decréscimo no percentual do PIB gasto no tratamento dessas pessoas.
(C) o elevado percentual de estudantes que já consumiram bebida alcoólica é indicativo de que o consumo do álcool é problema que deve ser enfrentado pela sociedade.
(D) as mulheres representam metade da população brasileira dependente de álcool.
(E) o aumento na porcentagem de brasileiros dependentes de álcool deveu-se, basicamente, ao crescimento da indústria do álcool.

QUESTÃO 02: (ENEM 2007) Leia os textos a seguir.

Texto I

O canto do guerreiro

Aqui na floresta
Dos ventos batida,
Façanhas de bravos
Não geram escravos,
Que estimem a vida
Sem guerra e lidar.
- Ouvi-me, Guerreiros,
- Ouvi meu cantar.
Valente na guerra,
Quem há, como eu sou?
Quem vibra o tacape
Com mais valentia?
Quem golpes daria
Fatais, como eu dou?
- Guerreiros, ouvi-me;
- Quem há, como eu sou?

Gonçalves Dias

Texto  II

Macunaíma (Epílogo)

Acabou-se a história e morreu a vitória.
Não havia mais ninguém lá. Dera tangolomângolo na Tribo Tapanhumas e os filhos dela se acabaram de um em um. Não havia mais ninguém lá. Aqueles lugares, aqueles campos, furos puxadouros arrastadouros meios-barrancos, aqueles matos misteriosos, tudo era solidão do deserto... Um silêncio imenso dormia à beira do rio Uraricoera. Nenhum conhecido sobre a terra não sabia nem falar da tribo nem contar aqueles casos tão pançudos. Quem podia saber do Herói?

Mário de Andrade

Considerando-se a linguagem desses dois textos, verifica-se que

(A) a função da linguagem centrada no receptor está ausente tanto no primeiro quanto no segundo texto.
(B) a linguagem utilizada no primeiro texto é coloquial, enquanto, no segundo, predomina a linguagem formal.
(C) há, em cada um dos textos, a utilização de pelo menos uma palavra de origem indígena.
(D) a função da linguagem, no primeiro texto, centra-se na forma de organização da linguagem e, no segundo, no relato de informações reais.
(E) a função da linguagem centrada na primeira pessoa, predominante no segundo texto, está ausente no primeiro.

QUESTÃO 03: (ENEM 2007) Leia os textos a seguir.

Texto I

Antigamente

Acontecia o indivíduo apanhar constipação; ficando perrengue, mandava o próprio chamar o doutor e, depois, ir à botica para aviar a receita, de cápsulas ou pílulas fedorentas. Doença nefasta era a phtísica, feia era o gálio. Antigamente, os sobrados tinham assombrações, os meninos, lombrigas [...]

Carlos Drummond de Andrade

Texto II

Antigamente

Acontecia o indivíduo apanhar um resfriado; ficando mal, mandava o próprio chamar o doutor e, depois, ir à farmácia para aviar a receita, de cápsulas ou pílulas fedorentas. Doença nefasta era a tuberculose, feia era a sífilis. Antigamente, os sobrados tinham assombrações, os meninos, vermes [...]

Comparando-se esses dois textos, verifica-se que, na segunda versão, houve mudanças relativas a

(A) vocabulário.
(B) construções sintáticas.
(C) pontuação.
(D) fonética.
(E) regência verbal.

QUESTÃO 04: (ENEM 2007) Leia o texto a seguir.

O açúcar

O branco açúcar que adoçará meu café
nesta manhã de Ipanema
não foi produzido por mim
nem surgiu dentro do açucareiro por milagre.

Vejo-o puro
e afável ao paladar
como beijo de moça, água
na pele, flor
que se dissolve na boca. Mas este açúcar
não foi feito por mim.

Este açúcar veio
da mercearia da esquina e tampouco o fez o Oliveira, dono da mercearia.
Este açúcar veio
de uma usina de açúcar em Pernambuco
ou no Estado do Rio
e tampouco o fez o dono da usina

Este açúcar era cana
e veio dos cananiais extensos
que não nascem por acaso
no regaço do vale.

[...]

Em usinas escuras,
homens de vida amarga
e dura
produziram este açúcar
branco e puro
com que adoço meu café esta manhã em Ipanema.

Ferreira Gullar. Toda poesia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980.

A antítese que configura uma imagem da divisão social do trabalho na sociedade brasileira é expressa poeticamente na oposição entre a doçura do branco açúcar e

(A) o trabalho do dono da mercadoria de onde veio o açúcar.
(B) o beijo de moça, a água na pele e a flor que se dissolve na boca.
(C) o trabalho do dono do engenho em Pernambuco, onde se produz o açúcar.
(D) a beleza dos extensos canaviais que nascem no regaço do vale.
(E) o trabalho dos homens de vida amarga em usinas escuras.

QUESTÃO 05: (ENEM 2007) Leia o texto a seguir.

Não só de aspectos físicos se constitui a cultura de um povo. Há muito mais, contido nas tradições, no folclore, nos saberes, nas línguas, nas festas e em diversos outros aspectos e manifestações transmitidos oral e gestualmente, recriados coletivamente e modificados ao longo do tempo. A essa porção intangível da herança cultural dos povos dá-se o nome de patrimônio cultural imaterial.

Internet. Disponível em: www.unesco.org.br

Qual das figuras abaixo retrata patrimônio imaterial da cultura de um povo?

(A)

(B)

(C)

(D)

(E)








GABARITO
01: C
02: C
03: A
04: E
05: C